domingo, janeiro 02, 2011

Quem escreve?

Alguns escritores bem comportados e politicamente corretos conseguem escrever por encomenda, enquadrando-se nas regras do mercado e na pauta do público, vendáveis e previsíveis textos.
Por outro lado, há escritores malditos, que são escritos por seus próprios textos, que ouvem vozes interiores, que alternam períodos de febril atividade com outros de apatia total, que escrevem coisas inadequadas e revolucionárias, incomodam, transformam e profetizam paradigmas, vislumbram mistérios, constroem ou derrubam impérios.
Sócrates, o filósofo, tinha lá o seu demônio interior. A palavra daemon, naquele época, tinha mais o sentido de gênio,não sendo considerado nem bom nem ruim; o daemon é a chama totalmente neutra, que tanto pode clarear o caminho quanto iniciar um incêndio.
Também tenho um daemon, uma chama acolhedora, que, criatura gananciosa que sou, espero que um dia seja minha pira. Por enquanto, a velinha ainda cintila tímida.
A idéia está lá, e é boa.
Começo pelo final, que é o objetivo principal de toda história: surpreender o leitor, provocá-lo.
Uma história pode começar por vários pontos. O enredo pode percorrer caminhos variados. Cada estilo valoriza, destaca ou minimiza diferentes conotações.
Há personagens que copiamos da vida, outros há que se impõem e vão falando e acontecendo à revelia do autor.
Histórias paralelas e acessórias, distribuídas sabiamente pelos capítulos, enriquecem a trama, levando o leitor a vaguear por temas paralelos previamente relacionados.
E então, o livro estando pronto, eis que o autor se surpreende. A idéia, que está lá, e é boa, funciona como pano de fundo para uma outra coisa, esta sim, o verdadeiro enredo, que se escreveu nas sombras.
O autor se descobre mero instrumento e humildemente se rende ao verdadeiro desconhecido autor de sua própria obra.

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